Crônica de Kátia Brito - estudante de jornalismo do Uni-BH - 1º período
Desde quinta passada – doze de junho – estou lendo uma das várias obras primas de Rubem Alves. E hoje tive a grata surpresa de ler um capítulo que se intitula: “Compaixão”. Com esse nome, eu esperava ler sobre fatos tristes e que me causassem comoção, porém não foi o que me aconteceu. Li o capítulo durante a minha viagem urbana de ônibus. E a cada linha que meus olhos tracejavam, me envergonhava das reclamações diárias que emito aos meus amigos e familiares. Ah! Eu não sou feliz! Ah eu queria ser mais magra! Ah! Eu queria poder comprar isso e aquilo! Ahhhhhh!
Enquanto eu perco meu tempo e minha saliva, algumas crianças perdem a sua infância nos semáforos vendendo balas e fazendo acrobacias com bolas, ou, até mesmo, objetos em chamas. E o pior, é saber que vejo essas cenas todos os dias e a única atitude que tenho é a de fechar os vidros ou dizer que não tenho dinheiro. Quando vejo os rostos tristes, clamando por comida e afeto pela televisão, aí sim eu esboço uma atitude digna, coloco a culpa no Presidente, no Senado, na Câmara e até mesmo nos pais desnaturados que deixam seus filhos irem as ruas pedir ou vender.
Muito fácil, não? Aqui, dentro do calor do meu lar, rodeada dos meus familiares, assentada no meu sofá confortável, com uma televisão vinte e nove polegadas e com um prato de sopa quentinho e falando mal de todos os culpados pela infância negada aos meninos de rua. Até esse momento, eu ainda não havia sentido um calor no coração que fizesse com que eu agisse de maneira diferente, o calor da compaixão, que segundo Rubem Braga é “Uma qualidade espiritual. E essa qualidade é a capacidade para ter compaixão. A paixão de compaixão, vem do latim passus, sofrer. Compaixão é ‘sofrer com’. Eu, individuo, não estou sofrendo. Sozinho sou feliz. Mas olho para um outro que está sofrendo: um menino sem agasalho, numa noite fria, pedindo uma moedinha, tarde da noite num semáforo”.
Senti-me assim no dia que uma criança solitária me pediu um afago. Foi surpreendente. Estava eu, sozinha, assentada num banco de praça, pensando na minha vidinha, quando um menino de uns quatro anos de idade, perguntou se eu queria comprar balas. Rude, respondi que não. “E um cafuné, a senhora faz em mim?”. Nossa! Como doeu. Não sei dizer se foi na alma ou no coração, só sei que doeu. Meus olhos ficaram rasos d’água. Tentei disfarçar com um sorriso amarelo e não pude negar aquela criança um carinho que com toda certeza, ela não deve ter ou nunca teve.
Desde esse episódio cotidiano, vejo as crianças de rua com outros olhos, com os olhos da alma, olhos de quem sabe que ali naqueles corpos residem almas grandiosas de sentimentos e que a carência é de material, não espiritual. E é nessas horas que percebo que sou mais digna de compaixão do que eles, porque sou carente, mas de sentimentos mais nobres no meu coração.
3 comentários:
Oh Lucas, Kátia Brito é colega de vcs? Se for e se ela fizer parte do SFW vcs tão feitos. É talento puro. Que baita crônica!! Fiquei todo arrepiado.
Aqui, o blog tá ótimo. Vou voltar a ler tmb o Olhar.
Nossos posts de hoje, de alguma forma, se conversam. Muito legal isso.
A piedade é um sentimentos que diferenciam o humano do animal.Ou pelo menos deveria. Rousseau, na sua obra, a Origem da Desigualdade entre os Homens, debate brilhantemente esta relação do homam com sentimentos ligados a querem bem o outro.
Kátia, piedade? Não. Esse sentimento é mais sublime, chama-se amor, que nos dá capacidade de vermos a nós mesmos no nosso semelhante. È algo mais profundo e envolvente que nos faz mover do nosso egoísmo e colocarmos no lugar do outro. Linda sua crônica.
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